terça-feira, 24 de setembro de 2013

Festas em Honra de Nossa Senhora da Saúde - Domingo - Missa Campal - VI

A Missa Campal decorria normalmente... Os fieis escutavam, atentos, a voz grave e pausada de D. Joaquim na sua homilia... Interiorizavam a mensagem, bebendo a sapiência presente no discurso do Bispo Auxiliar de Lisboa... No azul anilado do céu o sol brilhava de forma intensa... quase absurda... Os pássaros, nas árvores próximas, mantinham um silêncio solene e apenas a folhagem verde, que os envolvia e protegia, ondulava ao sabor da ligeira brisa que continuava a soprar de oeste... Dir-se-ia que, ao seu jeito, aprovava as palavras de D. Joaquim... Sinto um peso nas pálpebras... É, talvez, o sinal de pouco descanso... poucas horas de sono... já há muitas luas... Resisto ao peso e mantenho-as abertas... acho... Súbito... um som inaudível desperta-me de vez... Sinto... Algo se passou num ápice... Devo ter mesmo fechado os olhos por um segundo... Garanto que não foi mais do que isso... O ambiente está um pouco diferente... Há uma suave bruma que nos envolve... O som inaudível... Olho em redor e vejo pequenos seres angélicos tocando harpa ... ouçam... São querubins.... serafins... de seis asas... anjos... arcanjos ... Que lindas árias eles tocam...  Melodias que arrebatam o coração... Ouvem-se as vozes de todos os presentes a acompanharem o som encantado das harpas... Canta-se: "Quem é esta que vai caminhando, como  a aurora quando se levanta, formosa como a lua, escolhida como o sol, (...) Quão formosa, e quão engraçada és, ó caríssima..."/"Eu sou trigueira mas formosa (..) sou  a flor do campo, a açucena dos vales"...   Cada um dos crentes segura na sua mão direita uma rosa vermelha...
- Branca...
- Vermelha...
- Branca...
- Porque é que há de ser branca...?
- Quem é que está a ser homenageada?
- És Tu...
- A Mãe de Deus é homenageada com rosas brancas... não com rosas vermelhas...
- Eu posso querer oferecer-Te uma rosa vermelha..
- Tu podes... mas não uma multidão de crentes... Além disso fica garantido que não entras num qualquer devaneio mais ou menos perigoso...
- (És uma chata.)
- Eu li esse pensamento...
- Desculpa...

Cada um dos crentes segura na sua mão direita uma rosa branca... toda ela em botão... toda ela em flor... No seu olhar está refletida uma tranquilidade espetral... como se vivessem um momento eterno de deslumbramento e felicidade... Perto do altar... D. Joaquim, padres, diáconos, acólitos e demais colaboradores com um joelho no solo, seguram um cálice de fogo que, bruxuleante, purifica todo espaço em redor... Dele vão emanando ígneas línguas cujo tremular desenha no ar, círculos, rubis, yantras, silêncios, estrelas de várias pontas, esmeraldas... No lado oposto o coro paroquial eleva o timbre do seu cântico... Quiçá se possa...
- Não... Não se pode...
- Não... Pensei que não estivesses por aí...
- Estou sempre cá... como sabes... sempre atenta...

 No lado oposto o coro paroquial eleva o timbre do seu cântico... 
  - Já viste o que fizeste...? Perdi a inspirção...
- 'Tadinho... Já  a encontras...

... A harmonia do seu cantar  reflete-se na musicalidade celestial que brota das harpas angélicas... "As tuas face têm toda a beleza da rola, o teu pescoço o dos mais ricos colares (...) Como és formosa (...) como és bela! Os teus olhos são como as pombas (...) Os teus  labios são como uma fita de escarlate e o teu falar é doce"...  
Junto ao altar, esboçada em traços de oiro e luz, envolta numa aura celeste, a que pequenas pérolas cintilantes conferiam um ar nobre e sublime, estava Nossa Senhora... Abandonara a sua imagem em pedra,  e explêndida em toda a  Sua Glória, sorria... Sorria, feliz, com a percepção de que os seu filhos terrenos encontravam, em Si, o caminho para o Seu Filho... O Seu manto sagrado, em tons de alva brancura, estendia-se etéreo, intangível, sob os seus súbditos como que aconchegando-os ao regaço maternal... Num movimento singelo abriu as mãos  e acolheu-os a todos num perpétuo abraço de ternura... Junto à Virgem um casal ajoelhado é, então, tocado pela mão Imaculada de Nossa Senhora e envolto numa...
- Não me está a agradar... Quem é o casal...?
- Não sei... Ninguém sabe.. Qualquer casal...
- Portanto não vais identificar ninguém...?
- Não... poucochinho... Aliás, eu nem sei quem é o casal... Embora o perfil da senhora não me seja estranho... O do cavalheiro nem tanto... Acho que nunca o vi... Pelo menos ao vivo...
- Porque é que estou a sentir uma estranha inquietação?
- Não sei... Deves estar preocupada com outra pessoa...
- Não... não... esta inquietação tem a ver com o que estás a escrever...
- Preocupas-Te em demasia... Estou quase a concluir...
- Então conclui... Sou toda ouvidos... ou melhor... olhos...


Junto à Virgem um casal ajoelhado é, então, tocado pela mão Imaculada de Nossa Senhora e envolto numa espiral de luz que os une, quiçá por toda a eternidade... Ouvem-se as palavras suaves da Mãe de Deus: "Mesmo que nunca se unam na Terra este amor perdurá, a partir de agora, por todo o sempre..." Nesse momento, sempre ao som da harmoniosa música celestial, aromáticas pétalas de rosas vermelhas caem do céu  e como suaves carícias tocam a face de todos os presentes... Nossa Senhora retira-se para a Sua imagem e...
"Assim seja"...

- Tu és muito teimoso... Tinhas que ir ás rosas vermelhas...
- Foram só as pétalas...
- Já terminaste?
- Já... Não vais mexer em nada... pois não?
- Não... Vá lá... Não te esticaste... O que é que aconteceu ao casal...?
- A senhora voltou ao seu lugar... que não sei qual era... pois... conforme Te disse... não tenho a certeza de quem era... Embora tenha um palpite...
- Era bonita?
- Muito, muito bonita...
- Porque é que escreves duas vezes "muito"?
- Porque é mais bonita do que "muito"...
- Vós humanos sois tão complicados... E o cavalheiro...?
- O cavalheiro quando se retirava escorregou e veio ao rebolão pela escada abaixo... Ninguém soube mais nada dele... Um pobre coitado...












































Sem comentários:

Enviar um comentário